domingo, 15 de agosto de 2021
quarta-feira, 23 de junho de 2021
DESENGANO
Tique-taque, tique-taque, tique-taque...
― A hora não passa...
― Ansiosa?
― Não. Apenas preocupada...
Trim, trim, trim, trim, trim...
― O telefone... não vai atender?
― Não tenho coragem...
― Eu atendo.
― Alô... Sim... Ah! Ah! Ah!
― O que houve? Ele está bem?
― Sim... Está vindo.
― Oh, Deus! Que felicidade!
― Vem voando... Criou asas...
― De avião?!
― Não. Com a Maria fumaça...
― Piuí... piuí... piuí... piuí... piuí...
― Não acredito! Vou para a estação!
― Volte aqui! Cuidado! Meu Deus...
Blem, blem, blem, blem, blem...
― Como eu fui covarde...
Blem, blem, blem, blem, blem...
― Os sinos da igreja não param...
Blem, blem, blem, blem, blem...
― Deus, me perdoe... Não tive coragem.
Blem, blem, blem, blem, blem...
― Não tive coragem de dizer a verdade...
Blem, blem, blem, blem, blem...
― Se não encontrou ele na estação...
Blem, blem, blem, blem, blem...
― Pelo menos estão juntos no céu.
Blem, blem, blem, blem, blem...
Renato
Luiz de Oliveira Ferreira
terça-feira, 11 de maio de 2021
SAGRADO CANTO DA RECONSTRUÇÃO
Não importa se hoje há raios de sol ou se vai chover
Seja manhã, tarde, noite, ou qual bela estação a fruir
Quero um sentido pra vida além do ter e o vão prazer
Melhor ser, transcender, voar livre, reconstruir, devir
Pousar no alto da montanha, ver o novo, o anacoluto
Refletir as questões metafísicas e fugir do vento leste,
Praticar o mais belo verbo ― amar ― com o Absoluto
Sentir a suavidade da brisa oeste; minha alma veste
Pulsar o místico sopro do bem e soar a minha canção
Buscar o maitri,
karuna, mudita, upeksha e
praxidade
Confluir a alma e a tal felicidade, pureza na meditação
Encontrar com o outro, o Outro, através da alteridade
Sentir a deidade, o presente da vida, o Self, aqui e lá
Ter fé, entropatia, o dasein,
e a intuição do beija-flor
Sublimar o desejo do sagrado canto à humanidade já
Para um mundo pleno de luz, igualdade, paz e amor
Renato Luiz de Oliveira Ferreira
sexta-feira, 30 de abril de 2021
O MENINO QUE FALAVA COM PEDRAS
― Vovô virou pedra...
―
Não... morreu.
―
Conversei com ele hoje na beira do rio.
―
Conversou nada, moleque.
―
Disse que vai ficar ali. Voltou de onde veio.
―
Virou pó, besta.
―
Pedra, pó, terra... não tem diferença.
―
Sabe de nada...
―
A diferença é o tamanho.
―
Tá querendo me ensinar, moleque?
―
Não... o vovô quem me disse.
―
Disse nada! Ele está no céu.
―
Eu sei...
―
Acabou de falar que está no rio.
―
Sim. Ele disse que ali é o céu...
Renato Luiz de Oliveira Ferreira
terça-feira, 20 de abril de 2021
FIOS DE ESPERANÇA
A
alvorada invade lentamente minha alma
E
os raios colorem as flores do meu jardim
O
sabiá-laranjeira ecoa sua melodia calma
E
o desejo de Gonçalves Dias vive em mim
Brota
a bela-manhã lilás, branca e amarela
E
a vida tece a esperança de minha janela...
Renato Luiz de Oliveira
Ferreira
sexta-feira, 16 de abril de 2021
ENCONTRO DE ARADOS
― Olá, tudo bem?
― Sim...
Quer o quê?
― Uma
esmola...
― Esmola?!
― Estou
com fome. Preciso só de um...
― Por
que não arruma um emprego?
― Conhece
alguém que faria isso por mim?
― Não. Nesta condição é difícil.
― É o que ouço por aí.
― Não
devemos dar o peixe, mas...
― Com
fome é difícil aprender, e o lago está seco...
― Isso
não é problema meu.
― Eu
sei. O problema é nosso...
― Nosso?!
Por quê?
― Porque
preciso saciar a fome, e você...
― Entendi...
Por isso que você está assim.
― Sim.
Somos vítimas do capitalismo.
― Por
que somos vítimas?
― Vítimas
em polos opostos...
― Isso é
papo de vagabundo.
― Não
vivo de especulação financeira.
― Mas eles
não estão na miséria.
― Sim,
mas provocam a pobreza.
― Não
havia pensado nisso...
― Então...
Estamos no mesmo barco...
― Não. Tenho emprego, casa e comida.
― Por
enquanto...
― Hum... É esperto. Como chegou nesta situação?
― Hoje estou
assim, mas ontem era igual a você.
― Jogou
as oportunidades fora?
― Não. Apenas
o vento mudou de direção.
― Senti
até um frio na barriga agora.
―
Enquanto for só frio tudo bem. O pior é sentir um vazio...
― Entendi...
Vou ajudá-lo! Sabe por quê?
― Porque
tem piedade...
― Não...
É que até conhecê-lo eu era mais pobre que você...
― Isso
não! Tem quase tudo e ainda irá matar minha fome.
― Porém, antes você alimentou o meu paupérrimo espírito.
― Eu
apenas abri o coração...
― Posso
lhe dar um abraço?
― Mas, neste estado?
― Sim... Somos iguais e estamos na mesma.
― [...]
― Então, podemos começar a mudar o mundo.
― Ótima
ideia! Antes vamos saciar a fome para seguirmos em frente...
Renato
Luiz de Oliveira Ferreira