quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Como guardar alguém

Guardar não é acorrentar uma pessoa aos pés, mas deixá-la viver. Tudo isso com uma dose de carinho e presença permanente: no pensamento, fisicamente, espiritualmente...

Renato Luiz de Oliveira Ferreira

O mérito é para todos

O mérito não deve ser apenas para os vencedores, mas também para os que têm coragem de lutar, pois não há competição em forma de monólogo. Mesmo sendo você contra você, já são dois.

Renato Luiz de Oliveira Ferreira

Ângulos de Visão

Antes de argumentar, informe-se, reflita... Ponha-se no lugar do argumentado porque existem vários ângulos para enxergar um fato e apenas uma verdade cercada por várias conjecturas. Persuadir à força é coagir, é ser um infundado “Senhor da Razão” e um autêntico “senhor sem crédito”, causando desconfiança... Quem pesquisa enxerga com mais profundidade, livra-se da imbecilidade do senso comum. Porém, não esqueça que, em algumas situações, uma opinião contrária à da maioria pode ser a que todos precisam no momento, mas não é aceita devido à cegueira da vaidade humana.

Renato Luiz de Oliveira Ferreira

A Música

A música nasce dentro de nós. Morremos, mas ela continua viva no coração de alguém para sempre lembrar de alguém.

Renato Luiz de Oliveira Ferreira

domingo, 23 de dezembro de 2012

O Amor

O amor só é válido quando há permissão das partes para vivê-lo como um todo ― intensamente ―, sem pensar no amanhã, mas apenas senti-lo a cada instante, na forma mais pura possível.

Renato Luiz de Oliveira Ferreira

A Dosagem Correta

A distância entre o amor e o ódio é a mesma entre o bem e o mal; para medi-la basta desequilibrá-los. A dimensão entre amar e odiar é a mesma entre o bom e o mau, e é imensurável quando ambos estão separados por uma película de sensibilidade, portanto, é preciso ter cuidado com a atração, os seus polos são opostos; o choque entre eles pode provocar uma reação em cadeia e consequentemente uma fissão nuclearcaso não sejam controlados. Para equilibrá-los basta separar a emoção da razão e pensar nas consequências. Caso tudo ocorra bem, a dosagem de cada parte estará correta, e o sistema em pleno equilíbrio entálpico.

Renato Luiz de Oliveira Ferreira

A Fórmula da Felicidade

Adicione sabedoria, subtraia o egoísmo, multiplique a fé e divida o amor; pegue o resultado e sorria. Será exatamente feliz.
 
Renato Luiz de Oliveira Ferreira

Parágrafo Único

As leis são complicadas para o povo e dúbias para os juristas ― há sempre conjeturas ―; se fossem claras dispensaríamos as partes, e teríamos apenas justiça. Como existe uma entropia política, jurídica e social, neste país, o odor de injustiça paira no ar...

Renato Luiz de Oliveira Ferreira

Físico-Poética

O amor é o mais importante e complexo fenômeno natural do sentimento humano. Pode ser físico quando sentimos queimar e pulsar o peito, levado pelo movimento das lágrimas escoando pelo rosto em busca de alguém, e transformando termodinamicamente: o volume, a pressão e a temperatura da paixão em algo inexplicávelfilosófico. Pode ser poético quando viajamos do quântico ao mais infinito em busca de nossa identidade e de um sono tranquilo ao lado de uma verdadeira beldade-metade, cinematicamente sem preocupação com as suas causas, vivendo cada instante como sendo eterno, e sem querer entendê-lo, bastando apenas senti-lo, e deixando que a força de atração se encarregue do resto. Ele pode ser físico-poético quando ambos se fundem para o amor ser vivido intensamente de maneira atemporal, transformando a sua energia potencial em energia cinética para ultrapassar a barreira da lógica espiritual.
 
Renato Luiz de Oliveira Ferreira

ALEGORIA REBUSCADA

Ao Dicionário Aurélio e a “Joãosinho” Trinta
 

SALVADOR
1988


RESUMO

O objetivo deste trabalho, em homenagem ao Dicionário Aurélio e ao carnavalesco “Joãosinho”1 Trinta, é proporcionar ao ledor, além da reflexão sobre o tema, o enriquecimento do seu vocabulário. Hoje não há mais a necessidade de utilização de escritas com esmero excessivo; a clareza textual é importante para a facilidade da comunicação. Neste caso, a linguagem rebuscada é proposital para que o leitor procure um dicionário e saiba o significado de cada palavra. Sabe-se que poucos têm acesso a um léxico. Para não haver desânimo durante a leitura, nas páginas seguintes à poesia, consta o significado de cada vocábulo na ordem em que estão escritos para uma melhor compreensão dos termos utilizados.

NOTA: este trabalho foi escrito antes da Reforma Ortográfica da Língua Portuguesa que entrou em vigor em 1º de Janeiro de 2009, portanto, foram utilizadas as Normas Gramaticais da época.
 

O Autor
1 O correto seria escrever Joãozinho em vez de “Joãosinho”. Na língua portuguesa o sufixo diminutivo de João é “zinho”, porém, o carnavalesco escreve com “s” por opção. No caso do texto, foi respeitada a maneira excêntrica da escrita do nome do alegorista citado.

Alegoria Rebuscada

Antojar a aldebarã ao alegorista,
Belvedere bem brilhante surgirá,
Com calicromo, sem caligem e teísta.
Dealbação à diva, um desvario fã será.
Em cada rosto embriagado de beleza,
Fabulosas faíscas irradiarão energia.
Gazéis surgirão dos filóginos, uma proeza.
Homéridas inspirados, honrados e sem elegia,
Invadirão a passarela com iconolatria salutar.
Jactos de esperança e alegria, lado a lado;
Lágrimas combinando à fantasia e ao altar.
Magno e airoso “Joãosinho” Trinta, iluminado,
Nos braços da déia, nos brindará com o néctar:
O carnaval, as crianças, a vida e o Aurélio! É lei.
Porém, não esquecerá a grande diva real provecta.
Quando a pânria luz do alvorecer chegar, eu sei,
Reinarão os heliólatras com o seu ídolo cardeal.
Sobre a casta, um banho luzente do astro rei, meu Senhor!
Toscar o verdear é um toste à vida; é ser simples e leal,
Uma utopia com frase palíndroma: Roma é amor!
Vicejará, pois, na noite e no dia, vida nova: uma alforria!
Xurdir, sonhar, é a nossa obrigação, Mecenas. Duvidas do autor?
Zelar, perdoar, é com o Criador, da mais linda alegoria: a vida. Ria!

SIGNIFICADO DAS PALAVRAS DO TEXTO 

01. Alegoria: exposição de um pensamento sob forma figurada; ficção que representa um objeto para dar idéia de outro; continuação de metáforas que significam uma coisa nas palavras e outra no sentido.
02. Alegorista: pessoa que faz alegorias ou por elas explica escritos de outrem.
03. Rebuscado: apurado com esmero excessivo; requintado.
04. Antojar: pôr diante dos olhos; figurar; representar na imaginação.
05. Aldebarã: estrela de primeira grandeza. Pertence à constelação de touro.
06. Alegorista: que usa de estilo alegórico.
07. Belvedere: pequeno mirante; terraço alto de onde se descortina um vasto panorama.
08. Calicromo: que tem cores belas.
09. Caligem: escuridão.
10. Teísta: pessoa partidária do teísmo.
11. Teísmo: doutrina religiosa que admite a existência de Deus e sua ação providencial no universo.
12. Dealbação: purificação.
13. Diva: mulher formosa.
14. Desvario: ato de loucura, delírio.
15. Gazel: poesia amorosa ou báquica dos persas e dos árabes. Compõe-se de vários dísticos; os versos do primeiro rimam entre si e com o segundo verso de cada um dos outros.
16. Báquica: relativo ao deus do vinho (Baco) ou ao vinho; orgíaco.
17. Dístico: grupo de dois versos.
18. Filógino: apaixonado por mulheres.
19. Proeza: ação de valor, façanha, escândalo.
20. Homérida: rapsodo (cantor popular de rapsódias) que cantava os poemas de Homero; imitador de Homero, o maior dos poetas gregos.
21. Rapsódia: fragmentos de cantos épicos, entre os gregos, cada um dos livros de Homero; trecho de uma composição poética; composição musical formada de diversos cantos tradicionais ou populares de um país.
22. Elegia: poesia consagrada à tristeza.
23. Iconolatria: adoração das imagens.
24. Salutar: bom para a saúde, fortificante, moralizador.
25. Jacto: impulso.
26. Magno: grande, importante.
27. Airoso: belo.
28. “Joãosinho” Trinta: carnavalesco e alegorista. 
29. Déia: deusa.
30. Néctar: bebida dos deuses; bebida deliciosa; secreção adocicada; principal substância com que as abelhas produzem o seu mel.
31. Aurélio: o Dicionário de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira.
32. Provecto: muito sabedor, que tem progredido.
33. Pânria: preguiçosa.
34. Alvorecer: amanhecer.
35. Heliólatra: adorador do sol.
36. Cardeal: principal, fundamental.
37. Casta: raça, geração, natureza.
38. Luzente: luminoso.
39. Toscar: avistar, ver, entender.
40. Verdear: os campos verdes depois das secas.
41. Toste: saudação ou brinde, num banquete.
42. Leal: sincero, franco e honesto.
43. Utopia: fantasia.
44. Palíndromo: diz-se de, ou frase que tem o mesmo sentido quer se leia da esquerda para a direita, quer da direita para a esquerda. Ex: Amor é Roma.
45. Vicejará: brotará exuberantemente.
46. Alforria: libertação.
47. Xurdir: lutar pela vida.
48. Mecenas: protetor das letras e dos sábios. 

Renato Luiz de Oliveira Ferreira

REFERÊNCIA:

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda – Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, 11ºEdição, Gamma, 1985.

Trabalho e Liberdade

O raiar da liberdade num horizonte incerto
O suor do meu rosto são sementes de esperança
Das meninas de tranças, das morenas que dançam
Das fábricas que não lançam o perigo no ar
O sonho de não ver o velho e a criança
Tendo que trabalhar
Viva a mulher que batalha!
O sorriso, a luz, o brilho dos seus olhos
Que um pouco traduz o mistério do mar.
Viva o homem que batalha! Que grita o gol. Gol!
Que chora de amor, e que canta o país.
O povo precisa de trabalho, também precisa cantar
O meu futuro é o presente e o meu verbo é lutar
Morar, rezar, sonhar, dançar, voar! 
Viver um grande amor
O Homem não pode parar porque o tempo vai passar

Renato Luiz & Dedé Soares
Letra da música "Trabalho e Liberdade".

Por Você

Já fiz canções de amor
Tendo você, amei todas as mulheres
Deitei-me nas estrelas e beijei a lua
Nas minhas canções você era a favorita
Fiz guerrilhas, domei leões
Por você matei dragões
Você fez parte dos sonhos,
Ou será que eram alucinações
Venerava-lhe a uma rainha!
Por você eu construiria:
"Palácios" como o Taj Mahal
Atravessava a pé,
As montanhas que separam
A China do Nepal
Só desilusão restou
Onde está aquele amor
Que você me jurou,
Acabou? Será que acabou?!
Renato Luiz & Dedé Soares
Letra da música "Por Você"

Ponto de Equilíbrio

O ciclo do equilíbrio
As ondas do mar
Ponto yang yin
Trago a minha música
Para harmonizar

Já tomei de assalto
O seu coração
Mesmo que você
Relute e diga não

Nunca andei de carro importado
Nem de moto ou avião
Quando tenho dinheiro como bem
Se não tenho, como ilusão

Já li Nietzsche, Leibniz e Cervantes
Mas que bobagem
Se eu não posso ser
Seu cavaleiro errante

Como eu acredito
No ciclo do universo
Você um dia há de perceber
Que eu sempre estive aí tão perto
 Renato Luiz & Dedé Soares
Letra da música "Ponto de Equilíbrio"

Estado de Espírito

Todo poeta é louco
Alucinado ama intensamente
Intensamente não é amado
As pessoas que escolho
Os momentos acontecem
Fazer poesia não é dom
É um estado de espírito
Para se conceber uma poesia
Há de se ter dois elementos:
Uma mulher e um momento
Nossos momentos foram só poesias

 
Renato Luiz & Dedé Soares
Letra da música "Estado de Espírito"

Elegia Sertaneja

Cachaça no peito quema,
amô martela e dói suave.
Só quem já sentiu tal efeito,
cê sabe, o que eu sinto é grave.
Ela é bela e chera a fulô,
eu sou poeta e cantadô.
Do meu coração ela é a chave.

Tem mais de meis que fugiu,
com Zé, fio de Nhô Bento,
um home dono de gado.
Dexô só seu chero ao vento.
Correu, a mulé vã, ispura.
Trair é crime, injura!
Que farta de sentimento.

Mais há de senti sodade,
bem antes de minha morte!
Eu não vô fazê vingança,
eu sô caboco bem forte.
Eu vô insperá vortá,
no dia, eu vô ri e chorá...
Fazê cantoria no norte.

Ah! Vorta doce acalanto...
Vem cá, não isqueço d’ocê.
Meu chero, paz e alegria.
Amô, simbora por quê?
Eu quero rasgá sua seda,
fazê loa e amô na vereda,
ao sol pô, fulô de ipê.

"Acorda João!" "Levanta..."
Meu pai grita! Mãe, só improra...
Meu peito vazio adurmece,
mais fico contano a hora.
Cumeço a chorá, bebê...
Quiçá seja o meu prazê
dispois que bem foi simbora.

Amigo, eu tenho insperança!
É noite, eu vô só sonhá,
fulô do meu bem querê...
Agora a viola a tocá,
canção: luá do sertão...
O mote: elegia, afrição.
Ah, dô de amô de matá!
Renato Luiz de Oliveira Ferreira

Eu Vi

Ontem eu saí, tive medo de ficar na solidão
Confundi o ódio em sentimento de paixão
Eu vi a prostituta rindo, amando de coração
Amando seu homem sem pensar em solidão
Eu vi um homem sem cama fazendo poesia
Vagabundo cantando, e a sua amada dormia
Eu vi estrelas na noite que até então não via
Tudo isso acontecia enquanto você dormia
Eu vi o tempo parar, só para ouvir a poesia
E uma canção de amor que um bêbado fazia
Extasiei-me sem saber se era noite ou dia
Libertei-me para sempre das suas ironias
O tempo que eu estive ao seu lado dormia
Quando eu acordei vi estrelas fazendo folia
Feridas da vida doem, cicatrizam na canção
Marcas que ficam quem apaga é o coração
Sem saber por que, eu ri, senti você chegar
Eu vi, ouvi, chorei, falei de você pra o mar.
 Renato Luiz & Dedé Soares
Letra da música "Eu Vi"

Laus Deo/Louvor a Deus

Laus Deo

Ab imo corde, credo Deum esse
Ab incunabulis... Ora pro nobis,
Nota bene, homo faber:
Homo sapiens docendo discitur, quantum sufficit
Vinum et musica laetificant cor, Deo juvante
Jure et facto, omnia vincit Deo et amor
Gloria Patri

Louvor a Deus

Do fundo do coração, creio que Deus existe
Desde o princípio... Rogai por nós
Note bem, homem artesão:
O homem sábio aprende ensinando, o necessário
O vinho e a música alegram o coração, com a ajuda de Deus
De direito e de fato, o amor de Deus vence todas as coisas
Glória ao Pai

Renato Luiz de Oliveira Ferreira 

Nota: escrito em Latim. Língua indo-europeia, falada pelos habitantes do Lácio e, depois, em todo o Império Romano, do séc. VII a.C. ao V da era cristã.
Referências Bibliográficas:
BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada. Trad. João Ferreira de Almeida. 2. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993. Edição Revista e Atualizada no Brasil.
Dicionário de Latim. Disponível em: <http://www.dicionariodelatim.com.br/>, acesso em: 25/06/2012.
Dicionário online Caldas Aulete. Disponível em:<http://aulete.uol.com.br/site.php?mdl=aulete_digital>, acesso em: 25/06/2012.

sábado, 22 de dezembro de 2012

A INTERTEXTUALIDADE DE MACHADO DE ASSIS


Um dos pontos de partida na obra de Machado de Assis é a metafísica, que trata dos problemas filosóficos em sua forma clássica, com linhas racionais e não empíricas, que procura determinar as regras fundamentais do pensamento, as condições, causas, princípios, e as suas leis, dando evidência para o conhecimento do real como um todo ― transcendente ―, da humanidade. Uma adjetivação espirituosa ou filosoficamente profunda do ser, dando uma visão do sentido de existência do mundo, descoberta pelas luzes da razão. A palavra metafísica teve origem numa obra de Aristóteles, composta por quatorze livros sobre filosofia.
A Intertextualidade é uma referência explícita ou implícita de um texto em outro. Machado de Assis é um especialista nesta forma de escrita na literatura brasileira. Há situações em que de maneira imparcial, deixa o seu texto fluir, gerando uma energia literária com a sua epistemologia1. Machado insere o leitor na obra, com alusão, citação e referência, com o objetivo ousado e inovador, utilizando a sua narrativa como crítica à sua época, exemplificando obras anteriores, utilizando a sua forma rebuscada, escondendo a verdadeira essência, mostrando que um texto literário é influência ou continuação de outros textos. Isso fica claro nas referências bibliográficas de sua obra.
A intertextualidade da literatura europeia e da filosofia ocidental, textos sagrados, as artes plásticas, a história geral, a cultura popular, entre outras, estão presentes na obra machadiana. Conforme cita Celso Lima Latini, no seu trabalho: Organização, particularidades e as influências literárias na produção machadiana, Afrânio Coutinho menciona que um dos livros prediletos de Machado de Assis é “A Bíblia”― principalmente o livro Eclesiastes ―, porém, também com grande predileção por “Hamlet” de William Shakespeare, “Dom Quixote” de Miguel de Cervantes, “Prometeu” de Ésquilo, além da influência e leitura das obras de Pascal, Schopenhauer, Nietzsche, Dante Alighieri, Giacomo Leopardi, Eça de Queirós, Almeida Garrett, Alexandre Herculano, Thomas Hood, Heine, Charles Dickens, Henry Fielding, Laurence Sterne, Carlyle, Ritcher, Goethe, Darwin, entre outros. Baseado nas ideias dos grandes filósofos, pensadores e escritores, Machado cria o imaginário social brasileiro.
O ponto de partida na formação de sua obra, retratando o período histórico que vai do segundo reinado à República, são os seus romances da chamada segunda fase literária: “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, “Quincas Borba”, “Dom Casmurro”, “Esaú e Jacó” e “Memorial de Aires”. As obras nascem com o novo Estado, a Constituição da República Federativa do Brasil, liberdade de imprensa, organização militar das Forças Armadas ― principalmente o Exército ―, e com uma grande campanha abolicionista. A elite liberal brasileira nega-se a aceitar a identidade patriótica dos nacionalistas e governos, passa a defender que cada cidadão é representante de si mesmo. Ainda dependente economicamente da Inglaterra, o país bebe das artes e literatura europeia, com grande ênfase para a mais influente da época, a literatura francesa.
Utilizando a sua semiótica2 textual, Machado de Assis publica no ano de 1881 a sua obra “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, criando um narrador que conta a sua vida depois de morto, mudando radicalmente o panorama da literatura brasileira, expondo de forma irônica os privilégios da elite brasileira da época. Descreve a sua morte, a cena do enterro, os delírios antes de sua morte, retorna à sua infância, com digressão, objetivando esclarecer ou criticar o tema em questão por parte do narrador. A narração é feita em primeira pessoa e postumamente, ou seja, o narrador se autointitula um defunto-autor ― um morto que resolveu escrever suas memórias, utilizando referências, alusões e citações de outras obras existentes.
Realizando a fusão de dois ou mais elementos com sintagmas, estabelecendo um elo de subordinação entre o determinante e o determinado, formando uma unidade léxica, como no exemplo: "Queria-lhe, é verdade; ao pé dessa criatura tão singela, filha espúria e coxa, feita de amor e desprêzo, ao pé dela sentia-me bem, e ela creio que ainda se sentia melhor ao pé de mim”. Segundo Luís Filipe Ribeiro, em Mulheres de papel: um estudo do imaginário em José de Alencar e Machado de Assis”, o sentir-se bem do jovem Brás é todo feito de uma superioridade que vai do social ao físico, passando pelo moral. A própria construção da frase filha espúria e coxa denuncia a extrema maldade do narrador. Ao atribuir dois adjetivos a um mesmo nome, cria entre eles uma relação de equivalência, ou seja, as qualidades espúrias e coxa equivalem-se nesse sintagma, como a dizer que uma e outra decorrem da mesma causa.
Machado de Assis impõe grande quantidade de fragmentos discursivos, rompendo a linearidade da narrativa. As referências, citações, alusões da obra Memórias Póstumas de Brás Cubas, faz um elo entre o enredo e as obras relacionadas, sepultando o passado e mostrando o novo para entrar de vez na atemporalidade3 com sutileza e profundidade, sendo que muitos dos problemas e desmandos da sociedade da época ainda estão presentes no Brasil contemporâneo, de forma ironicamente atualizada. Como exemplo da sua atemporalidade para a sociedade moderna, existe na parte amorosa, a célebre frase: “Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis”. Essa é uma das características do estilo machadiano, explorando as figuras de linguagem de eufemismo e ironia. Marcela é prostituta de luxo, mas na obra não há, em nenhum momento, a caracterização nesses termos nem que naquela relação, amor e interesse financeiro estão intimamente ligados.
Portanto, Machado de Assis, com maestria, faz o leitor sentir e pensar, para entender a essência do texto com o humor irônico, que é uma de suas marcas, sempre guiada pela sua intertextualidade, desmascarando as faces ocultas da alma humana ― principalmente as imperfeições da classe dominante ―, com metalinguagem4 e excelência gramatical que o levaram ao ápice da literatura brasileira. Uma reflexão para o leitor com sensibilidade literária, que jamais será o mesmo após ler a obra machadiana. A sua visão filosófica será aguçada, transbordando os limites do conhecimento humano.

Renato Luiz de Oliveira Ferreira5

 

1Estudo crítico dos princípios, hipóteses e resultados das ciências já constituídas, e que visa a determinar os fundamentos lógicos, o valor e o alcance objetivo delas; teoria da ciência, do conhecimento.
2A arte dos sinais. Denominação utilizada, principalmente pelos autores norte-americanos, para a ciência geral do signo; semiologia, ciência geral dos signos, segundo Ferdinand Saussure, que estuda todos os fenômenos culturais como se fossem sistemas de signos. Em oposição à linguística, que se restringe ao estudo dos signos linguísticos, ou seja, da linguagem, a semiologia tem por objetivo qualquer sistema de signos (imagens, gestos, vestuários, ritos, etc.).
3Relativo a atemporal, em que não há tempo; fora do domínio do tempo.
4A linguagem utilizada para descrever outra linguagem ou qualquer sistema de significação: todo discurso acerca de uma língua, como as definições dos dicionários, as regras gramaticais, etc.
5Possui graduação em Engenharia Mecânica com habilitação em Controle e Automação pela Universidade Cruzeiro do Sul – UNICSUL.


  
Referências bibliográficas: 
ASSIS, Machado de. Memórias Póstumas de Brás Cubas. 28ª edição, São Paulo; Editora Scipione, 1994, p. 150.
CANDIDO, Antonio. Formação da Literatura Brasileira. 7ª edição, Belo Horizonte; Editora Itatiaia, 1993, p. 150.
COSTA, Érika Maria Asevedo. A Intertextualidade em Memórias Póstumas de Brás Cubas UFPB.
COUTINHO, Afrânio. Machado de Assis na literatura brasileira. In: Machado de Assis. Obra completa: romances. Rio de Janeiro: José Aguilar, 1963, v. 1, p. 23 – 64.
CRUZ, Maria de Fátima Berenice da. A volubilidade da narrativa machadiana. Conferência proferida no Fórum educacional: convivendo com as diferenças por ocasião do centenário Machado de Assis (19/11/2008 – Riachão do Jacuípe-BA).
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, 2º Edição, Nova Fronteira, 1986.
LATINI, Celso Lima. Organização, particularidades e as influências literárias na produção machadiana.
RIBEIRO, Luís Filipe. Mulheres de papel: um estudo do imaginário em José de Alencar e Machado de Assis. Niterói: EDUFF, 1996.

Declaração Lusofônica

À Sandra
 
Tenho um sentimento enrustido pela gramática da língua portuguesa. Fernão de Oliveira não tem a ideia da gratidão que tenho por ele, por ter sido o pai da gramática da lusofonia. João de Barros deu continuidade à bela criação.
Entre mim e ela foi paixão à primeira vista. Pena que não lhe dei o devido amor, apesar de ter dado o devido valor. Ela descobriu que eu a traí com a matemática ― essa só me trouxe "problemas" ―, a outra sofreu de ciúmes.
Estou tentando reconquistá-la aos poucos, infelizmente sempre cometo deslizes. Recentemente ela comentou que eu ainda preciso conhecê-la melhor, ir com mais calma... ― coisas gramaticais.
Peço-lhe um favor, já que vocês vão conviver lado a lado: procure tratá-la bem daqui pra frente, com muito carinho, atenção e respeito. As regras serão meros detalhes, porém, importantes para uma boa relação.
Peço-lhe mais um favor, não esqueça! Ao tocá-la, diga-lhe bem baixinho... que eu a amo!
O amor só é válido quando há permissão das partes para vivê-lo como um todo ― intensamente ―, sem pensar no amanhã, mas apenas senti-lo a cada instante, na forma mais pura possível.

Renato Luiz de Oliveira Ferreira

A Tristeza da Letra Agá

Não tenho sentido algum, não correspondo a nenhum som. Vivo de favores etimológicos: no início de certas palavras, no fim de algumas interjeições ou em alguns dígrafos. Sou apenas um símbolo; excluíram-me até do meu nome!

Juntar-me-ei ao “K”, ao “W” e ao “Y”, vou embora, para sempre! Pensando bem, não vai ser possível... elas voltaram para o alfabeto após a reforma da língua portuguesa. Que dificuldade.

E se eu fizer um protesto? Acho que não adianta, a fonética nem irá notar, eu não existo para ela.

Eu quero existir para as crianças, e que digam ao aprender: “A de avião!”, “B de bombom!” e “agá” de algo que não seja: homem, Helena... Elas podem existir sem mim.

Estou triste... Por favor, ajudem-me!  Deem sentido à minha existência para que eu não sirva só de enfeite ou companhia para as palavras. Existir não é apenas ocupar um lugar no espaço, mas ter uma função.

Ah! Lembrei-me de um detalhe... Existe uma coisa que me deixa orgulhosa... é que a Bahia jamais seria a mesma sem agá.

Renato Luiz de Oliveira Ferreira

 

 

 

 

 

Obs.: Obra registrada na Fundação da Biblioteca Nacional. A mesma pode ser divulgada desde que seja mantida a autoria.